domingo, 30 de setembro de 2012

O MORTO

Sou um morto, um fantasma que assombra esta casa, só agora entendo isso. Eu morri naquele dia em que me matei cortando a garganta, mas, como um erro, a vida continuou na minha cabeça. Eu faço compras, recebo telefonemas, vivo e respiro, mas na verdade sou um fantasma. Meus amigos, alguns são espíritos como eu, perdidos, procurando se encontrar, outros continuam existindo, me visitando, conversando comigo, mas só existem de verdade em outro plano, se é que ainda não morreram. Minha mãe, meu pai, minha irmã e eu, tudo de mentira. Até minha filha continua crescendo. Eu continuo envelhecendo, fazendo cicatrizes, machucando aqui e ali, ficando fraco, as vezes doente, mas sou só um fantasma nesse mundo irreal. É impressionante como morremos sem o perceber. Passam-se anos e nem nos damos conta. Imaginava aqueles jovens suicidas, Jim Morrison, Jimi Hendrix, espíritos novos eternamente. Agora sei que eles envelheceram, ficaram velhinhos e ninguém os viu passar por aí. Assim, este texto não tem muito sentido, já que não pode ser lido, exceto por fakes e alguns fantasmas.

Escrevo pra mim, pra não esquecer, por me preocupar com minha irmã menor que ontem a noite tinha pesadelos, para que seus sonos sejam mais tranqüilos.

O LOUCO

Os olhos brancos brilhavam ao se deparar com uma sensação nova, sentia um novo fluxo de sangue percorrer seu lóbulo esquerdo como tentáculos nunca usados, se transformando num novo por prazeres incomuns do tipo que não se deve afirmar sentir, e voltou a si pasmo, por ter tido tais pensamentos pervertidos, sabendo dos futuros problemas que lhe podia acarretar tais pensamentos novos e prazerosos. Então levantou, tomou seus remédios e foi pra rua ver assassinos em roupas cotidianas, ladrões que pagassem sua cerveja, amigos pedófilos e todo tipo de pessoas normais da onde a perversão fazia parte da natureza humana. Seus amigos eram esquizofrênicos, bipolares, adictos. Ele queria ser normal, até perceber que ninguém era normal de perto. Repensava sua vida e estava diante de um mundo novo de loucos, associáveis, delinquentes, criminosos... ao mesmo tempo que isso deu nova cor as pessoas à sua volta não sabia como conseguiria sobreviver a tal selva de vida fora de tudo ao que tinha sido educado como certo, errado e suas convenções. Pensou em enlouquecer, parar de tomar seus remédios, mas não sobreviveria. Sua filha não viveria sem ele.

E daí, como uma tarde em que plumagens balançavam no fim do dia, como repouso e consolação de que a vida não tinha só um fim em si mesmo, mas um consolo de continuar como o passeio naquele parque, com os olhos na plumagem das árvores sob o cair da tarde, sabia que iria continuar a tudo fazer sentido e a loucura dos transeuntes seria extinta em cada passo sentido à razão, como o vento a espalhar o movimento nas folhas depois de um dia de pensamentos tão atribulados.

O NOVO DONO DE ANIMAIS

Ele possuía um vazio na alma que o seguia aonde ia. Com uma ânsia, ele seguia sua vida rotineira. Trabalhava nove horas por dia no escritório, era um excelente funcionário. Pagava suas contas muito bem. Tinha família, alguns poucos amigos. Mas aquele vazio o estava matando. Foi aí que planejou seu primeiro assassinato.
Comprou um passarinho numa loja de animais e o soltou dentro do apartamento para ele se adaptar. Por um mês botou ração todos os dias, água e limpou seus excrementos. Em seguida comprou um gato, o qual deu o nome de killer, mas tomou cuidado para colocá-los em ambientes diferentes. Por último veio o cachorro, com quem brincava agressivamente com restos de carne no fundo da lavanderia. Quatro meses se passaram com cada animal isolado em seu quarto até que, numa sexta feira, depois de chegar em casa... Sua tia o foi visitar.

Levou rosquinhas caseiras de aveia, falou que estava muito magro e pálido. Brincou com cada um dos animais. Acabado os biscoitos, deu um beijo em sua testa e antes de ir embora ajeitou seu cabelo perguntando sobre as ‘’meninas’’, se tinha alguma em vista e por fim foi embora. Quando se despediu, a euforia tomou conta e foi correndo soltar os bichos. Nesse momento tocou a campainha.

Uma vizinha, que mexendo muito o cabelo e rindo nervosamente, disse que estava fazendo uma festinha no apartamento do lado e perguntou se ele queria aparecer mais tarde. Se livrou rapidamente da vizinha e voltou à cena do crime. Primeiro soltou o passarinho, que voou desesperadamente pela sala. Depois abriu o quarto do gato que tentou de toda forma pegar o passarinho. Mas o circo pegou fogo quando do fundo da área de serviço foi solto da coleira o cachorro, que foi correndo como um louco para atacar o gato e o passarinho.

Após algumas horas, os três animais brincavam pela sala como uma verdadeira família. O cachorro com o gato, o gato com o cachorro e o passarinho passeava no meio dos dois como um velho irmão ali pela sala. Pasmo pensou que alguma coisa estava errada. Como crianças já cansadas, dormiram os três, um encostado no outro ali mesmo na sala depois daquela farra na casa dele, o dono de cada um dos animais de estimação que ali estavam depois daquele encontro tão bem sucedido por seu dono. Algo de estranho tinha naqueles animais pensou o homem. Talvez fosse um erro deixá-los tanto tempo juntos no mesmo apartamento... O homem não parava de pensar.

Depois de sua festa diabólica frustrada, foi para cama. Ainda atordoado, teve um sonho estranho, com a vizinha que o convidou naquela noite para uma festa... Seus cabelos, seu sorriso, aquilo mexeu com sua imaginação. Embalado pelo sonho só se viu uma ponta de sorriso no quarto escuro. Matar a vizinha talvez fosse uma boa idéia.

A MAÇÃ

Então, aquele homem, desenganado pela vida, sentou sobre o chão e desfrutou da tranqüilidade do domingo. E toda luz revelou uma paisagem pálida e brilhante. O mundo nunca mais seria o mesmo. Ele vivia uma imagem tipicamente realista. Seus olhos estavam cansados, pois já não sentia a intensidade das cores, porém, a luz branca daquele dia calmo banhava os seus poros lentamente. Preso no tempo, como um relógio, estava exausto, com uma ressaca diferente das que estava acostumado. Levantou-se com esforço sentindo uma dor no pescoço. Começou a caminhar sobre aquelas ruas que antes estariam cheias de carros e pessoas, sozinho, com muito tempo para pensar. Sentia sua alma pra dentro fazendo com que seu corpo ficasse arqueado, de olhos pro chão. Não sabia pra onde caminhava, só queria pensar. E não resolvia nada pensar naquela hora. Então caiu algo em sua cabeça e olhou para cima.

Uma voz do alto, um equilibrista pediu-lhe desculpas por deixar cair sua maçã. __Desculpe! Minha maçã caiu! Surpreendido pelo funâmbulo saiu de seu transe instantaneamente. __Quer que eu jogue? __Antes dê uma mordida! Ao sentir o doce da fruta extremante suculenta de cor rubra, seu rosto corou. Jogou a fruta ao circense que lhe agradeceu e foi embora. Continuou seguindo seu caminho, agora, mais aliviado. Pensou que talvez estivesse com fome. Olhou para traz e o equilibrista aos poucos fora sendo coberto pelos prédios. Naquela mesma tarde anoiteceu e vieram cores em seu pensamento. Mas de fato ele nunca mais foi o mesmo.